As causas do apagão ainda não foram oficialmente divulgadas, mas o fornecimento de energia começou a ser restabelecido de forma gradual ao longo da noite.
Entre medo, improviso e muita ansiedade, brasileiros que vivem em Portugal contaram como enfrentaram as horas de incerteza.
O episódio ocorreu pouco depois de a Comissão Europeia ter alertado todos os Estados-membros para que incentivassem a criação de kits de sobrevivência para emergências, incluindo estoques de alimentos não perecíveis, água, lanternas, pilhas e rádio.
Para muitos, o alerta parecia distante — até agora.
Desespero em meio ao apagão
A advogada Emanuelle Santos, de 32 anos, que mora em Portugal há quatro, viveu momentos de tensão. Mãe de três filhos e com o marido com o braço fraturado, ela enfrentou apuros.
"Quando cheguei à estação de metrô vi que estava sem energia e a internet começou a falhar. Entrei em pânico quando vi as notícias", relatou.
"A babá que estava com meus filhos ficou com medo e foi embora, então corri para casa. Comprei alguns suprimentos no mercadinho porque a gente não estava preparado. Foram muitas horas sem energia e sem internet. Foi desesperador ficar sem contato com a minha família. Por mais que havia muita hipótese [de haver situação que precisasse de kit emergência], a gente nunca acha que isso vai acontecer."
Mercado e ruas em caos
Para Marcella Martins, de 26 anos, natural do Rio de Janeiro e moradora de Portugal há três anos, a experiência também foi angustiante. Ela relatou que acordou com o celular carregado por sorte, mas logo viu as mensagens de alerta.
"Corri no mercado para montar um kit de emergência. Comprei enlatados, arroz, macarrão, velas. Ainda bem que o fogão é a gás. Foi tenso: sem sinal de celular, imaginando mil coisas, até em guerra eu pensei. A rua e o mercado estavam um caos. Agora é deixar o kit pronto, nunca se sabe", disse a imigrante que trabalha em Portugal como empregada de mesa.
"Trabalhar sem luz era quase impossível. Vendemos cigarros anotando tudo à mão. A rua e o mercado estavam um caos. Pensei em guerra, em mil coisas."
Marcella destacou ainda a sensação de isolamento: "Sem sinal de celular, sem comunicação... fiquei pensando na minha família no Brasil. Pode parecer exagero, mas achei que era mais do que uma simples queda de luz."
Nas redes sociais ela publicou como foi a ida ao supermercado:
Sophia Gamonal, de 24, estudante de mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde, estava na faculdade quando a energia foi interrompida. Sem aulas e sem dinheiro disponível, precisou se adaptar.
"O trânsito estava caótico sem semáforos, os multibancos (caixas eletrônicos) deixaram de funcionar. Não consegui entrar no prédio porque a porta era eletrônica e precisei esperar outra moradora chegar", contou.
"As minhas maiores preocupações eram em relação à comida congelada estragar, eventualmente faltar água nas casa e comida nos supermercados, e em relação aos doentes nos hospitais."
Apesar dos contratempos, Sophia compartilhou como foi o momento de alívio, já por volta das 21h:
"Quando a luz voltou, as pessoas aplaudiram, gritaram e soltaram foguetes."
Estoque de água improvisado
Para Eliane Ribeiro, de 42 anos, brasileira de Belo Horizonte que também mora em Portugal, um grande desafio foi a mobilidade.
Sem metrô e com ônibus superlotados, ela cancelou o dia de trabalho e voltou para casa preocupada com a filha.
“Quando saí do trabalho para ir trabalhar, não tinha metrô. Os ônibus estavam cheios e nem paravam. Cancelei os trabalhos do dia, não mandei a minha filha pra escola. Demorei a chegar em casa, mas graças a Deus ficou tudo bem. Enchi várias vasilhas de água, a banheira também. Foi bem ruim.”
O que aconteceu em Portugal?
Portugal enfrentou, nesta segunda-feira (28), um apagão inédito que deixou o país quase um dia inteiro sem eletricidade, do fim da manhã até a noite.
O corte de energia afetou transportes, comércio, comunicações e serviços essenciais em todo o território, e expôs fragilidades no sistema energético nacional, conforme reconheceu o primeiro-ministro, Luís Montenegro, em pronunciamento oficial.
O blecaute teve início por volta das 11h30 (horário de Lisboa) e interrompeu o funcionamento de trens, metrôs, elevadores e sistemas de sinalização.
Supermercados e lojas ficaram sem operações eletrônicas e, mais tarde, sem abastecimento de alimentos e água.
Comunicações móveis e internet também falharam em várias regiões, chegando ao blackout total em algumas zonas.
A recuperação da eletricidade começou ao fim da tarde, partindo do norte em direção ao sul do país. Em algumas regiões, a normalidade só aconteceu na madrugada desta terça (29).
Em declaração após um Conselho de Ministros extraordinário, Luís Montenegro explicou que o problema teve origem na rede elétrica espanhola —de onde Portugal estava importando energia devido ao custo mais competitivo— e pediu serenidade à população. A causa exata ainda será apurada.
“A situação que nos conduziu não é de autonomia. Temos capacidade de produzir energia”, disse Montenegro. "Mas, na verdade, nós, por razões financeiras, estávamos a importar energia de Espanha porque estava com um preço mais competitivo."
Montenegro declarou oficialmente "situação de crise energética" e defendeu mudanças na distribuição de energia da União Europeia, para reduzir a dependência exclusiva da rede espanhola.
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